O termo brain fog pode ser traduzido como “névoa mental”. Não é um termo médico nem científico, mas descreve uma série de sintomas neurológicos como a dificuldade em manter a atenção ou a concentração, a sensação de lentidão de pensamento e a presença de alterações de memória.
À medida que as comunidades médica e científica vão descobrindo mais sobre o SARS-CoV-2, vão sendo identificadas inúmeras sequelas de um vírus que afeta vários sistemas do organismo. O cérebro e outras áreas do sistema nervoso são também afetadas, não só na altura da infeção por COVID-19, mas também após a alta clínica, com repercussões cognitivas que podem prolongar-se no tempo, às vezes, durante meses.
O brain fog, ou o conjunto de sintomas neurológicos que compreendem este termo, é uma das sequelas mais reportadas por pessoas que estiveram infetadas com COVID-19, afetando não só os casos mais graves, que necessitaram de cuidados intensivos, como também os assintomáticos.
Fique a conhecer um pouco melhor o modo como a infeção por COVID-19 afeta o sistema nervoso e conheça também algumas sequelas, como o brain fog, que podem colocar em risco a sua saúde e um regresso à normalidade.
O vírus SARS-CoV-2 utiliza um recetor de uma enzima (ECA2) presente no nosso organismo como porta de entrada nas vias aéreas e pulmões, sistema cardiovascular, renal e intestino delgado.
Os principais sintomas apresentados (febre, tosse e dificuldade respiratória) manifestam-se principalmente no sistema respiratório, mas acabam por afetar outros sistemas do corpo, nomeadamente o Sistema Nervoso Central (SNC) e o periférico (SNP). O vírus da SARS-CoV-2 pode afetar o Sistema Nervoso de duas formas:
Ao detetar o vírus da SARS-CoV-2, o sistema imunitário desencadeia um forte processo inflamatório que resulta numa produção desregulada e exagerada de citocinas (moléculas pró-inflamatórias), inflamação essa que vai afetar as paredes dos vasos sanguíneos (endotélio). Este facto pode estar na origem de parte das sequelas neurológicas da COVID-19, desde as mais ligeiras às potencialmente fatais. Por outro lado, observa-se uma tendência para o surgimento de sequelas mais graves em pessoas com COVID 19 mais severa, quando comparado com pessoas com infeção ligeira ou mesmo assintomática.
Os quadros de manifestações neurológicas da COVID-19 podem ocorrer em várias fases: fase aguda, na convalescença da doença ou de forma prolongada no tempo (4 semana após a cura). As manifestações nesta última fase têm sido designadas como Long COVID Syndrome.
Observemos então os principais quadros de manifestações neurológicas provocadas pela COVID-19, sem esquecer que são quadros clínicos que, muitas vezes, se prolongam no tempo.
Estão entre as queixas mais frequentes de sequelas de longo prazo da COVID-19, logo a seguir à fadiga e à falta de ar. É difícil descrever o brain fog. Engloba um conjunto de sintomas que pode, muitas vezes, ser comparável com uma sensação próxima do jet lag ou decorrente de insónias e distúrbios de sono. A pessoa sente-se mais lenta, tem dificuldade em encontrar as palavras ou em executar determinados movimentos, de tal forma que pode afetar o desempenho no dia a dia. Simplesmente não se sentem as mesmas, desde que tiveram COVID-19. Este é um quadro que pode ser transversal a pessoas que estiveram assintomáticas ou que estiveram internadas.
Este é um quadro que tanto pode resultar do menor aporte de oxigénio ao sangue, uma vez que a COVID-19 afeta o sistema respiratório, como dos focos de inflamação provocados pela infeção. Entre os principais sintomas observa-se uma desorientação no tempo e espaço, discurso confuso, lentificação do pensamento, agitação, eventual perda de memória ou mesmo crises epilépticas. Esta é uma patologia observada em cerca de 65% das pessoas que precisaram de apoio ventilatório nos cuidados intensivos. Pode ser um quadro transitório, com um bom prognóstico, ou deixar sequelas graves, se se prolongar no tempo.
A dificuldade respiratória é um dos sintomas da COVID-19 que mais exigiu um internamento nos cuidados intensivos. Uma das causas possíveis para esta insuficiência pode dever-se à destruição de células no tronco cerebral, responsáveis pelos processos cárdio-respiratórios. Este é um fenómeno que já foi observado em outros coronavírus, mas não há provas irrefutáveis que confirmem esta relação.
Estão apontados como dos sintomas mais frequentes da COVID-19, desde o início da pandemia, e que, muitas vezes, se prolongam após a alta clínica. De acordo com dados da Direção-Geral da Saúde, cerca de 25% dos infetados queixaram-se com dores de cabeça (cefaleias), 27% com dores no corpo (mialgias) e 20% com fraqueza generalizada (astenia).
São sintomas que, muitas vezes, precedem as queixas respiratórias e que podem prolongar-se no tempo, mesmo após a cura. A perda de olfato (hipósmia) pode ser justificada pela invasão direta dos bulbos olfativos pelo vírus SARS-CoV-2, através do nariz, numa zona ligada diretamente ao cérebro, que não é protegida nem revestida (lâmina cribosa do etmóide). Já a perda de paladar (disgeusia) parece ser uma situação mais transitória, uma vez que afeta apenas as papilas gustativas e a mucosa. A perda do olfato, porém, pode prolongar-se por 2 a 3 meses.
Em alguns casos mais raros tem sido observada uma polineuropatia aguda (ou Síndrome de Guillain Barré), caracterizada por uma fraqueza muscular com uma evolução ascendente, inicialmente atingindo as pernas e progredindo em horas a dias para os braços, diafragma e face. Geralmente ocorre algumas semanas após os primeiros sintomas da infeção, podendo ocorrer também em doentes com infeção SARS-CoV-2 assintomática. É uma consequência bastante grave da COVID-19 e pode ter uma recuperação demorada.
O processo inflamatório desencadeado pela infeção por COVID-19 pode conduzir ao aparecimento de trombos nos vasos sanguíneos, podendo provocar o AVC isquémico. Por outro lado, a diminuição de concentração de oxigénio no sangue (hipóxia) pode contribuir para o AVC. No entanto, e devido à alta incidência, quer de COVID-19, quer de AVC, não se pode afirmar que existe maior ocorrência de AVC em doentes infetados com o SARS-CoV-2.
Muitas das sequelas da COVID-19 que se prolongam no tempo podem afetar o dia a dia e colocar em risco a sua saúde física e mental. Quando detetados precocemente, esses sintomas podem ser vigiados e traçadas estratégias terapêuticas que lhe devolvam a qualidade de vida que tinha antes da pandemia. É ainda importante despistar que os seus sintomas neurológicos que foram detetados após a infeção COVID19 não se devem a outras doenças que se manifestam de forma semelhante ao síndrome pós-COVID.
Se sente sintomas como os do brain fog ou se simplesmente não se sente o mesmo desde que foi infetado pela COVID-19 marque a sua consulta e proteja a sua saúde.