De acordo com dados da UNICEF, cerca de 46% dos jovens portugueses dos 13 aos 15 anos afirmam ter sofrido ou ter estado envolvidos em situações de bullying no ano anterior.
O bullying é um comportamento ofensivo, cuja principal característica é a agressão verbal, física ou por outros meios, de forma continuada, entre uma ou várias vítimas e um ou vários agressores. Pode acontecer em vários contextos, mas é na escola que ocorrem os primeiros episódios. Falámos com a Psicóloga Joana Sousa Teles para perceber o que é o bullying, quem envolve e o que podem fazer os pais para travar este comportamento, não só quando acontece, mas também (e sobretudo) antes de ele acontecer.
Existem vários tipos de bullying, mas todos eles têm características em comum, que são a existência de uma intenção, a consistência, e o facto de se tratar de um ato que se repete. É isso que distingue o bullying de outros tipos de agressão. Por outro lado, importa ter em conta que este tipo de comportamentos pode visar uma ou mais vítimas, bem como ser provocado por um ou mais agressores. Por último, em termos de ação, o bullying pode assumir a forma de ameaça ou de agressão, que pode ser verbal, física ou relacional. Se acontecer através da Internet, dá-se pelo nome de cyberbullying.
O bullying pode acontecer também entre adultos, nomeadamente num contexto profissional. Por outro lado, é mais comum falarmos de bullying num contexto escolar. Tendo em conta os estadios de desenvolvimento da criança, acredito que aconteça mais a partir dos 10 anos de idade, ou seja, na entrada na pré-adolescência, portanto a partir do 2º Ciclo, 3º Ciclo. É nestas idades que as crianças começam a desenvolver os seus traços de personalidade e também quando se manifestam as grandes questões ligadas aos processos de autoestima.
Uma criança com baixa autoestima, com tendência para se isolar, mais insegura ou que, por exemplo, tenha alguma característica física diferenciadora como ter excesso de peso, poderá ser mais suscetível a ser vítimas de bullying.
Depois a situação repete-se porque, normalmente, há uma não reação por parte das vítimas.
No caso das meninas é frequente a questão física, e nos rapazes alguém que se vista, por exemplo, de uma forma mais feminina, que também tenha excesso de peso ou que não seja bom a jogar à bola. Isto de uma maneira muito geral.
Existem alguns estudos, mas apontam perfis muito diferenciadores. Por um lado, um agressor pode ser alguém que, à partida, não faz uma boa regulação das suas emoções. Não consegue, por exemplo, gerir bem a frustração e acaba por manifestar um caráter mais agressivo. Por outro lado, pode também ser alguém que é bully precisamente para esconder traços de introversão ou de ansiedade, tornando-se agressor porque acredita que se agredir primeiro nunca vai ser uma vítima. É quase uma questão de "autodefesa". É muito importante trabalhar também sempre o agressor no bullying e não apenas as vítimas. Porque se não for feito, a situação de bullying vai repetir-se.
Muitas vezes há vítimas de bullying que se tornam elas próprias agressores. Exatamente porque acreditam que existem estes dois posicionamentos: se eu me tornar agressor, nunca mais volto a ser vítima. Também pode acontecer um agressor cometer as suas primeiras agressões ali pelos 10, 11 anos e que mantenha esse perfil de agressão indeterminadamente, sobretudo se não for trabalhado. Cada caso é um caso.
O bully apresenta características como, por exemplo, falta de empatia, dificuldade na gestão de emoções como saber frustrar, necessidade e prazer em subjugar o outro, ou dificuldade em reconhecer e respeitar limites. Poderá ser alguém que teve uma educação pobre em termos de contenção, ou seja, uma educação demasiado permissiva que o ensina a ter prazer independentemente daquilo que possa provocar no outro.
No caso da vítima os sinais são mais fáceis de identificar, porque podem apresentar alterações no comportamento. As crianças vítimas de bullying podem mostrar-se mais tristes, com tendência para se isolarem também em casa, com alterações a nível da alimentação, ou seja, passarem a comer menos, dificuldades em dormir, além dos chamados “sintomas psicossomáticos” como dores de barriga, de cabeça ou do corpo, sobretudo no final de cada dia ou no dia anterior a irem para a escola. Pode acontecer inclusive que verbalizem que não querem ir para a escola ou, no limiote, que digam que "preferiam morrer".
Outro sinal, frequente, sobretudo em crianças que já foram bons alunos, é começarem a baixar o seu nível de performance escolar. Nas aulas ficam mais desatentos porque antecipam o tempo de intervalo e temem o que possa voltar a acontecer.
Os pais devem ajudar de imediato o filho, porque se contou é porque está a pedir ajuda, e devem sempre incluí-lo no processo. Idealmente, e numa primeira fase, devem perceber se existem estratégias que o ajudem a sair deste ciclo do bullying e reunir de imediato com a escola. Uma situação de violência é sempre inadmissível e deve ser algo que ninguém, criança ou adolescente, deve tolerar.
Diariamente devemos conversar com os nossos filhos fazendo perguntas mais objetivas: "como é que correu a escola?", ou até perguntar sobre um amigo específico, "estiveste com o João? O que fizeram no intervalo de almoço?", ou mesmo "conta-me uma coisa que hoje tivesses gostado mesmo muito de fazer" ou "houve alguma coisa que te tenha chateado hoje?".
Muitas vezes as crianças são como nós adultos, que saímos do trabalho e queremos desligar. Eles também querem desligar da escola. E quando acontece o bullying, algumas crianças não contam logo este tipo de situações porque têm medo. Têm medo das reações e que a situação em si piore. São crianças que, muitas vezes, não respondem, não reagem, e por isso é que o bullying continua. Porque se a vítima reagir logo no início, pedindo ajuda a um adulto ou respondendo, acredito que se quebra o ciclo do bullying. E o agressor, se não for ajudado, o que acontece é que vai só mudar de vítima. Ele vai quebrar o ciclo com aquela pessoa mas vai passar para outra vítima.
A forma como educamos e estruturamos os nossos filhos, para não criarmos vítimas nem agressores, pode passar por uma coisa muito simples: não bater nos nossos filhos. É meio caminho andado para eles perceberem que, se um dia alguém lhes bater, é uma coisa totalmente errada. É completamente errado dizer "uma palmada de vez em quando nunca fez mal a ninguém". Faz! Porque eu, infelizmente, posso estar a ensinar ao meu filho que bater é um método de correção. E que se um dia alguém lhe bater isso é normal. É a normalização de uma agressão que é física, ou verbal, e que não deve acontecer. Se tivermos uma relação de respeito com os nossos filhos, seja nas coisas que lhes dizemos, seja nas coisas que lhes permitimos nos dizer, eles vão perceber quando acontece qualquer coisa que não é expectável, como o bullying. E vão reagir a isso!
Importa também conversar com os nossos filhos sobre este tema e explorar com eles se já aconteceu, se já observaram a acontecer com alguém e até perceber se eles têm as ferramentas necessárias para reagir caso um dia lhes aconteça.
Por outro lado, promover uma educação onde damos afeto e limites ensina-os a também tratar bem os outros porque desenvolvem duas coisas muito importantes que são saber regular emoções e a ter empatia pelo outro.
A criança testar os pais faz parte de um desenvolvimento normativo. A forma como os pais reagem a isso é que fará toda a diferença.
Se damos afeto então também podemos dar regras e contenção. Uma criança que sente a contenção por parte dos seus pais é uma criança que se vai desenvolver num ambiente onde se sentirá mais protegida e por isso mais segura.
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