A microbiota intestinal é um sistema dinâmico, composto por microorganismos que têm uma influência importantíssima na nossa vida. Fique a saber no que consiste a microbiota intestinal, que funções desempenha, e como a adoção de um estilo de vida saudável pode ajudar a que estes microrganismos contribuam para a nossa saúde.
Em 1670, Antoine van Leewenhoek descobriu na lamela do seu microscópio diversos pequenos organismos a que hoje chamamos microbiota intestinal. Passados mais de 350 anos, ainda há muito para desvendar sobre a microbiota. Hoje sabemos que é um verdadeiro ecossistema de microrganismos que evoluíram para fazer do nosso corpo a sua casa, tirando proveito do que comemos e, em troca, ajudam-nos a metabolizar nutrientes essenciais e a defendermo-nos de microrganismos nefastos à saúde.
A microbiota é composta por milhares de biliões (1014) de bactérias, vírus, fungos e outros microrganismos. O seu número é tão vasto que existem mais células da microbiota do que células do corpo humano. Na verdade, a microbiota existe em todo o corpo, mas é no intestino que se encontram em maior quantidade. Entre os microrganismos que compõem a microbiota intestinal distinguem-se várias espécies:
A composição da microbiota intestinal é diferente de pessoa para pessoa e está bastante dependente do nosso estilo de vida.
Alguns estudos apontam para que haja já uma transferência de bactérias da microbiota da mãe para o feto através da placenta. Na altura do parto, chegam determinadas bactérias essenciais ao intestino do recém-nascido. Aliás, dependendo do tipo de parto, natural ou por cesariana, há diferenças entre o tipo de microrganismos que colonizam o intestino do bebé. Do mesmo modo, a microbiota varia também pelo simples facto do bebé ser alimentado por leite materno ou por leite de fórmula. Aliás, sem a presença de uma determinada bactéria especializada (Bifidobacteria), o recém-nascido nem sequer seria capaz de metabolizar os açúcares do leite. À medida que mais alimentos vão sendo introduzidos, o número de diferentes microrganismos presentes na microbiota intestinal aumenta e diversifica-se.
A partir dos 2 a 3 anos de idade, a microbiota intestinal estabiliza, mantendo a sua forma durante a maior parte da idade adulta, continuando a ser afetada pelo que comemos, pelo exercício que praticamos, pelo sono ou pela medicação que tomamos.
Os diversos microrganismos que compõem a nossa microbiota intestinal desempenham várias funções indispensáveis ao saudável funcionamento do nosso corpo. Entre elas destacamos:
A ação da microbiota permite decompor moléculas complexas provenientes de alimentos como carne e vegetais. Damos como exemplo vitaminas essenciais como a vitamina K, aminoácidos ou vitamina B12 ou ácido fólico, por exemplo. Por outro lado, a microbiota digere as fibras, produzindo ácidos gordos de cadeia curta. Além disso, promovem a absorção de minerais essenciais como o ferro, magnésio ou cálcio. Por outro lado, ter uma microbiota saudável ajuda a regular o apetite, na medida em que contribui para a sensação de saciedade.
A microbiota acaba por “competir” contra bactérias invasoras pelos nutrientes. Numa pessoa com uma boa microbiota é muito mais difícil observarem-se casos de infeção provocadas por salmonela, por exemplo, ou por outras bactérias nocivas ao organismo.
Os microrganismos que compõem a microbiota “ensinam” o sistema imunitário a reconhecer substâncias benéficas ao organismo e a destruir substâncias tóxicas. A este processo denomina-se imunidade adaptativa.
Os microrganismos da microbiota sintetizam hidratos de carbono indigeríveis em ácidos gordos que serão fonte de energia para as células do revestimento do intestino, facilitando a absorção de sal e água, além de sintetizarem proteínas e vitaminas do complexo B. Este é um dos processos que fortalece a barreira física do intestino contra agentes patogénicos.
A microbiota é um sistema dinâmico cuja eficiência depende da saúde do hospedeiro e das suas escolhas de alimentação e estilo de vida. Vários estudos demonstram que um desequilíbrio na microbiota, denominado disbiose intestinal, pode estar na origem de doenças como a obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares, síndrome do intestino irritável, asma, cancro, doença celíaca, esclerose múltipla ou síndromes do espectro do autismo, por exemplo. Nesse sentido, adotar comportamentos saudáveis é benéfico não só para os microrganismos que nos colonizaram como também para a nossa própria saúde.
O consumo de açúcares, gordura, sal e aditivos alimentares pode conduzir à diminuição das bactérias benéficas e ao aumento de inflamação e consequente doença. A adoção de uma alimentação variada e equilibrada, como a Dieta Mediterrânica, promove a manutenção de uma microbiota intestinal saudável. Entre os alimentos que se destacam estão os ricos em fibra (prebióticos), como a aveia ou o trigo, além dos vegetais ricos em betacaroteno, zinco, ferro e polifenóis, como a cenoura, espinafres, leguminosas, fruta ou ervas aromáticas. O azeite, por ser uma gordura monoinssaturada, também tem um impacto positivo na microbiota, assim como o consumo de peixes gordos, dos quais a sardinha ou o carapau são exemplos.
Vários estudos têm apontado para uma maior diversidade de microorganismos em pessoas que praticam exercício físico regular, sobretudo quando são comparados a microbiota de pessoas sedentárias. Por outro lado, a atividade física é um excelente antídoto ao excesso de peso e obesidade, condições que, além de terem impacto negativo (também) na microbiota intestinal, refletem-se na saúde em geral.
A toma de alguns tipos de medicamentos, como os antibióticos, podem ter um impacto negativo na microbiota intestinal. Estes fármacos, além de eliminarem bactérias nocivas, também diminuem o número de bactérias da microbiota intestinal. Aconselhe-se com o seu médico sobre a toma de probióticos quando estiver a tomar antibióticos, de modo a que possa compensar a sua microbiota intestinal.
Vários estudos apontam para que uma má higiene de sono promova disbiose intestinal. A manutenção de um sono de qualidade e em quantidade de horas tem um impacto positivo na microbiota intestinal.
Em situações de stress, o cérebro segrega cortisol na corrente sanguínea, dirigindo energia para zonas do corpo que necessitem de ser mais irrigadas, como os membros, por exemplo. Em resultado, a digestão atrasa e os níveis de acidez no estômago alteram-se. Se o stress for crónico, poderá trazer distúrbios na microbiota intestinal que podem desencadear inflamação e doença. A prática de Meditação é uma boa solução para ajudar a controlar episódios de stress e pode contribuir para a manutenção de um equilíbrio saudável dos microrganismos que compõe a microbiota intestinal.
A doença provocada pelo vírus do SARS-CoV-2 é ainda relativamente recente, desconhecendo-se muitas das consequências que a infeção deixa no corpo humano e, também, no equilíbrio da microbiota intestinal. Estudos recentes têm apontado para um impacto complexo do vírus da COVID-19 na microbiota humana. Por um lado, diminui o número de microrganismos, deixando espaço livre para que bactérias nocivas proliferem no intestino. Isso provoca disbiose, que, por sua vez, fragiliza a barreira do intestino, permitindo a passagem de bactérias para a corrente sanguínea. O resultado, verificado em vários pacientes, é que essas bactérias acabam por provocar infeções secundárias, algumas de gravidade severa, em várias partes do corpo.
A microbiota intestinal funciona como um ecossistema sensível a muitas perturbações, e o seu equilíbrio pode ser afetado por vírus como o SARS-CoV-2.