Quimioterapia: como diminuir os efeitos secundários

data de publicação14 Julho 2022 autor do artigo
Sérgio Barroso  |  Oncologista

A quimioterapia consiste na administração de fármacos com o objetivo de destruir as células cancerígenas. No entanto, a quimioterapia pode afetar também as células saudáveis, provocando efeitos secundários a vários níveis. Fique a conhecer alguns efeitos secundários da quimioterapia e o que deve e pode fazer para minimizar os impactos na sua saúde.

Como atua a quimioterapia?
As células cancerígenas originam-se a partir de células normais que sofreram alterações genéticas e que começam a multiplicar-se de forma acelerada e descontrolada, originando neoplasias malignas (tumores malignos). Estes tumores invadem tecidos e órgãos vizinhos normais, levando à sua destruição ou disfunção. Além disso, podem também libertar-se da sua origem e entrar na corrente sanguínea ou no sistema linfático, provocando novos tumores noutros locais do corpo (metástases).

Tecidos afetados

As células tumorais dividem-se, em regra, mais rapidamente do que as células saudáveis. Por outro lado, o organismo não tem grande controlo sobre os seus processos. É tirando partido dessas diferenças que os fármacos da quimioterapia atuam. No entanto, existem tecidos saudáveis - sobretudo os que têm uma capacidade de divisão mais rápida (à semelhança das células cancerígenas) - que podem ser mais afetados pela quimioterapia. Falamos da medula óssea, onde se produzem as células do sangue, dos folículos pilosos, que dão origem ao cabelo e aos pelos, as unhas, ou o epitélio intestinal, respiratório e geniturinário (genitais) que formam as camada que revestem estes órgãos. Também os testículos e ovários são afetados, podendo ocasionar diminuição da fertilidade transitória ou forma definitiva.

Quando se fazem sentir os efeitos secundários?

Os efeitos secundários podem ser sentidos de modo imediato ou apenas passados alguns dias. Em geral esses efeitos secundários são temporários e desaparecem após o final dos tratamentos.
 
Efeitos secundários da quimioterapia
Os principais sintomas dos efeitos secundários da quimioterapia são o cansaço, as náuseas, vómitos e diarreia. Aqui descrevemos as principais zonas do corpo afetadas e o que se pode fazer para diminuir esses efeitos do tratamento contra o cancro.

Toxicidade no sangue
A quimioterapia afeta a produção dos componentes do sangue na medula óssea, provocando várias condições.

ANEMIA

Esta condição deve-se à diminuição de glóbulos vermelhos no sangue.

Recomendações:

  • Dieta rica em ferro
  • Várias refeições ligeiras ao longo do dia
  • Alimentos fáceis de digerir como sopa, leite e cereais
  • Poupança de energia para atividades mais importantes

 

NEUTROPENIA

Consiste na diminuição de neutrófilos no sangue, um tipo de glóbulos brancos que faz parte do sistema imunitário, o que torna o organismo mais sensível a infeções.

Recomendações:

  • Especial atenção e cuidado à higiene oral
  • Lavar regularmente as mãos, usar máscara e manter o distanciamento social
  • Diminuir a ingestão de alimentos crus, assim como frutos de casca fina quando não cozinhados, frutos secos ou mariscos
  • Evitar o consumo de ervas aromáticas ou especiarias após a confeção dos alimentos
  • Evitar cortes acidentais
  • Evitar o contacto direto com animais domésticos

 

TROMBICITOPENIA

É a diminuição do número de plaquetas no sangue, o que aumenta a probabilidade de hemorragias.

Recomendações:

  • Evitar danos físicos como ferir-se ou cortar-se
  • Utilizar escova de dentes macia
  • Substituir lâminas por máquinas de barbear
  • Evitar substâncias com interferência nos níveis de plaquetas como aspirina e álcool
  • Não tomar medicamentos que não tenham sido recomendados pela equipa clínica
  • Manter a calma se tiver uma hemorragia e contactar a equipa clínica
     
Boca e tubo digestivo
Alguns fármacos utilizados na quimioterapia podem provocar lesões na boca e garganta, náuseas, vómitos, diarreia ou prisão de ventre.


MUCOSITE

Esta inflamação pode ocorrer ao longo do tubo digestivo. Quando atinge a boca pode haver uma sensação de ardor, secura e vermelhidão da mucosa oral (face interna das bochechas, língua e lábios), ou mesmo formação de aftas e infeção. Quando atinge o intestino pode ocorrer diarreia.

Recomendações:

  • Usar uma escova de dentes macia e pasta de dentes bicarbonatada
  • Fazer bochechos com maior frequência com soluções que não contenham álcool
  • Preferir alimentos macios ou triturados e à temperatura ambiente
  • Evitar alimentos duros, salgados, ácidos, picantes e bebidas alcoólicas
  • Não fumar


NÁUSEAS E VÓMITOS

São dos efeitos secundários mais comuns. Podem surgir nas primeiras horas após o tratamento ou na primeira semana. Na prevenção e controle destes sintomas são utilizados medicamentos específicos chamados antieméticos. Podem ser administrados um ou mais no início da sua sessão de quimioterapia de modo a prevenir náuseas e vómitos agudos.

Recomendações:

  • Comer em pequenas quantidades, sem pressa, e várias vezes ao dia
  • Preferir cozidos e grelhados, pouco condimentados, com pouco cheiro e à temperatura ambiente
  • Beber líquidos pouco açucarados


DIARREIA

A quimioterapia, a ansiedade e a modificação do regime alimentar podem provocar diarreia. Se não for controlada pode levar à perda de líquidos e sais minerais, ou mesmo à desidratação.

Recomendações:

  • Iniciar imediatamente uma dieta apropriada com pouca fibra e pouca gordura
  • Tomar a medicação antidiarréica prescrita pelo médico
  • Reforçar cuidados de higiene e aplicar pomadas que promova a cicatrização e o alívio de dor se houver irritação local
  • Beber 2 a 3 litros de água por dia
  • Beber sumos de fruta cozida, néctar de pêssego ou alperce, sumos de cenoura ou banana e comer gelatinas
  • Evitar o leite e derivados


OBSTIPAÇÃO

A obstipação, ou prisão de ventre, deve-se à toxicidade da quimioterapia gastrointestinal aliada a uma alimentação com poucas fibras, à reduzida ingestão de líquidos e à falta de atividade física.

Recomendações:

  • Adequar a alimentação, com alimentos ricos em fibra e frutas como a ameixa, laranja ou quivi.
  • Adicionar farelo de trigo a sopas e iogurtes
  • Tomar bebida quente cerca de 30 minutos antes da hora habitual do seu funcionamento habitual
  • Ingerir mais líquidos todos os dias
  • Praticar, se possível, exercício físico diariamente
  • Falar com o médico acerca da necessidade de um laxante

Cabelo e pele
Um das consequências mais estigmatizantes da quimioterapia é a alopecia (queda de cabelo). Além deste efeito secundário, alguns fármacos da quimioterapia podem ainda provocar alterações na pele.


ALOPECIA (queda de cabelo)

Ocorre, normalmente, a partir da 2ª semana do tratamento, podendo ser total ou parcial. Por norma começa com uma sensação de formigueiro e desconforto no couro cabeludo, à qual se segue o desprendimento da raiz. Cerca de 2 a 4 meses após terminados os tratamentos o cabelo volta a crescer, muitas vezes um pouco mais ondulado.

Recomendações:

  • Utilizar escova de cabelo macia ou pente com dentes largos
  • Usar champôs suaves com pH neutro (para bebés) e aplicar creme amaciador
  • Evitar secador de cabelo próximo a temperaturas altas
  • Evitar lacas, gel, colorações ou permanentes.
    Na alopecia total poderá:
  • Usar peruca, lenços, gorros, chapéus ou, simplesmente, assumir a alopecia
  • Usar protetor solar, caso tenha o couro cabeludo exposto
  • Ter cuidado com as constipações, uma vez que um quarto do calor que o corpo liberta é pela cabeça
  • Evitar o uso permanente de peruca para que o couro cabeludo possa “respirar” e que para que seja menor o risco de irritações da pele.

 

EFEITOS NA PELE

É um dos tecidos mais sensíveis à quimioterapia. Entre as reações mais frequentes destacam-se a descamação, vermelhidão, comichão e escurecimento da pele (sobretudo nas mãos, braços e face que estão mais expostos ao sol).
Também podem ocorrer fissuras, gretas, inflamação, vermelhidão, ardor e formigueiro nas palmas das mães e plantas dos pés.

Recomendações:

  • Evitar tomar banhos com água muito quente
  • Utilizar gel de banho hidratante
  • Evitar esfregar-se com a toalha quando se seca
  • Usar hidratantes corporais
  • Evitar a exposição solar e usar sempre cremes com o maior fator de proteção possível
  • Evitar atividades que submetam a pele a fricção ou pressão
  • Usar roupa larga e calçado confortável
  • Utilizar luvas quando mexer em produtos irritantes como produtos de limpeza

A nível muscular
Falta de forças e dores musculares são sintomas comuns da quimioterapia. Podem ocorrer horas ou dias depois dos tratamentos e, com o decorrer destes, conduzir a alterações funcionais como perda de equilíbrio, dificuldade em segurar objetos ou executar movimentos delicados (como apertar botões de uma camisa). Estes sintomas podem continuar a verificar-se meses após o fim da quimioterapia e agravarem-se com o frio.

Recomendações:

  • Cumprir a prescrição da medicação para a dor
  • Ter cuidado na execução de atividades que envolvam o manuseamento de objetos perigosos, frágeis ou que estejam a temperaturas extremas
  • Usar calçado antiderrapante

Sensibilidade à luz
A fotossensibilidade (sensibilidade à luz), o lacrimejo frequente e a sensação de “areia nos olhos” são outros sintomas que podem resultar da quimioterapia. Inflamações como a conjuntivite também são frequentes.

Recomendações:

  • A utilização de óculos escuros, mesmo dentro de casa
  • Evitar variações bruscas de luminosidade
  • Evitar o uso de cosméticos
 
Os sintomas agravam-se? Fale com o seu médico
A evolução da medicação para o cancro é constante. Hoje, a quimioterapia é mais dirigida à doença, sendo possível um maior controlo dos efeitos secundários. No entanto, e uma vez que a ação da medicação é diferente de pessoa para pessoa (e de cancro para cancro), é importante dar feedback à equipa médica cada vez que os efeitos adversos da quimioterapia ultrapassem o expectável. Tal pode interferir, inclusive, na continuação e no sucesso do tratamento. É por isso muito importante que siga a prescrição do seu Oncologista Médico e não se automedique.

Autor do artigo

Sérgio Barroso

Oncologista